O homem usava enormes óculos estilo caçador, sem lentes, e nariz de palhaço. Aproximou-se das pessoas que esperavam o ônibus em frente ao Pátio do Colégio, bem ali onde São Paulo um dia começou. Uma policial viu e achou por bem afugentá-lo para os lados da Quinze de Novembro. Afinal, não está certo importunar quem está quietinho, sentado no banco sob a cobertura metálica, esperando o busão sabe lá Deus para onde. O homem reclamou, peitou a policial, mas logo se conformou e atravessou a rua. Quando fui falar com Celestino, ele pedia a um jardineiro uma mudinha de planta para dar de presente à policial que momentos antes o enxotara. Aceitou ser entrevistado, avisando de cara que era carioca, que gostava de mulher e que votou no Lula.
Vidas & Imagens: Qual o seu nome?
Celestino: Celestino.
V&I: Onde você nasceu, Celestino?
Celestino: Rio de Janeiro.
V&I: Como você veio parar em São Paulo?
Celestino: Minha mãe me trouxe pra cá com dois anos.
V&I: Então você sempre morou em São Paulo.
Celestino: É, eu sou paulistano, praticamente.
V&I: E o que você faz da vida?
Celestino: Rapaz... Eu faço o que a vida faz de mim.
V&I: O que você gosta de fazer, Celestino?
Celestino: Eu gosto de dançar, de mulher e de beber.
V&I: Dançar o que? Samba?
Celestino: Rock.
V&I: Rock? Você é roqueiro?
Celestino: Opa! Eu tenho 52 anos. Eu sou um dinossauro do rock, né? Rolling Stones.
V&I: Além dos Rolling Stones, de quem mais você gosta, Celestino?
Celestino: Ângela Maria.
V&I: Mas Ângela Maria não é rock. Ângela Maria é parceira do Cauby.
Celestino: Eu também adoro Cauby Peixoto.
V&I: Cauby é ótimo. Eu fui ver um show dele no Bar Brahma. O cara continua em forma.
Celestino: Em forma!
V&I: Celestino, você trabalha?
Celestino: Não, não trabalho.
V&I: Está parado.
Celestino: Eu tou. Aqui em São Paulo, a pessoa com 50 anos não consegue emprego.
V&I: É verdade.
Celestino: Ainda desdentado, não consegue.
V&I: O que você fazia antes?
Celestino: Era protético. Fazia dentes. Também era vendedor de sapatos na rua Augusta. Em 72, trabalhei no supermercado Eldorado. Naquela época... Agora, tou com 52 anos.
V&I: Você nunca casou?
Celestino: Eu fui amigado. Tenho um filho, ele tá lá no Paraná.
V&I: Você falou do Lula. Você gostou dele?
Celestino: Eu voto no Lula. Lula lá e eu aqui!
V&I: Tem eleição de novo daqui a 3 semanas.
Celestino: Ainda bem que eu vou votar de novo. Eu vou votar de novo e ele vai ganhar.
V&I: Agora você vai dar essa plantinha pra PM?
Celestino: Ahn.
V&I: Posso tirar uma foto sua?
Celestino: Pode. Mas eu tou disfarçado... Eu sou agente da Uncle.
V&I: Ah, me conta outra coisa: porque você está com esse nariz de palhaço?
Celestino: Porque eu votei no Lula...
V&I: Alguém te deu o nariz de palhaço quando você foi votar no Lula?
Celestino: Não. Eu compro e vendo.
V&I: Na 25 de Março?
Celestino: Na 25... Como é que você sabe?
V&I: A 25 é logo ali. Todo mundo sabe. Mas diz uma coisa. Onde você fica? Está sempre por aqui?
Celestino: Às vezes. Já dormi ali naquela rua. Naquela porta ali.
V&I: O que você espera do futuro?
Celestino: O futuro é o governo. Não é ladrão, não é sanguessuga, não é mensalão.
O futuro é honestidade no país.
V&I: Celestino, vou imprimir uma foto para você e espero te ver de novo.
Celestino: Tá, tudo bem.
V&I: Tudo de bom!
Celestino: Também!
E Celestino atravessou a rua, em direção à base móvel da Polícia Militar, plantinha nas mãos, um
presente para a bela PM que policiava o Pátio.